O êxito ou fracasso de uma fundação, bem como a possibilidade de aparecimento de problemas, pode ter origem ou mesmo depender de uma imensa variedade de aspectos. A prova de carga é o único método de se avaliar se uma fundação atende ou não as especificações previstas em projeto.
Não se sabe ao certo quando se deu a primeira prova de carga, entretanto, segundo Timosshenko (1953), provavelmente o primeiro registro venha com Galileu Galilei que realizou testes de carregamento submetendo determinadas estruturas a certos tipos de cargas com o objetivo de estudar as tensões atuantes. Ao observar estruturas e a resistência dos seus materiais, ele chegou à conclusão que a resistência é proporcional a área da seção transversal.
Antes de Galileu, o conhecimento era passado de construtor para construtor e as construções eram dimensionadas de acordo com a intuição, as tentativas, erros e acertos do responsável pela construção da edificação. Nas estruturas de fundação, a fundamentação teórica se deu paralelamente ao uso do método empírico. É impossível, portanto, falar da importância das provas de carga em fundações, sem mencionar como é feito o dimensionamento e projeto destas estruturas. Além disso, é interessante traçar um paralelo histórico entre o desenvolvimento dos métodos semi-empirícos, que hoje são utilizados para dimensionamento e projeto de fundações e o uso de provas de carga para aferir a capacidade de uma fundação.
1ª Prova de Carga do Brasil em estacas tipo Franki – 1935 – Fonte: Urbano Alonso
As boas práticas da engenharia civil são catalogadas por meio da normatização. No mundo o processo de normatização surgiu paralelamente a revolução industrial, tendo o primeiro registro de discussão na segunda parte do século XIX. Como existia a ideia de que o custo da normatização seria alto e as normas ficariam defasadas rapidamente, o primeiro esforço efetivo ocorreu apenas no início do século XX com o congresso International Electrotechnical Commission (IEC). No Brasil, o processo de normatização foi um pouco tardio uma vez que somente na década de 30 surgiram as primeiras indústrias em território nacional. A criação da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas só ocorreu em 1937.
Fundação da ABNT -1937
A partir do processo de normatização surgiram diversos métodos semi-empíricos de previsão de capacidade de carga para o dimensionamento de fundações profundas. Esses métodos de previsão de capacidade de carga são diversas formas de regressão linear comparando o número de golpes obtido através do SPT (Standard Penetration Test) com a carga obtida através das provas de carga.
Prova de carga em estaca tipo Franki (Tóquio 1926) – Fonte: Urbano Alonso
Os métodos de cálculo mais utilizados são: Aoki-Veloso (1975), Décourt-Quaresma (1978, 1982,1987), Pedro Paulo Velloso (1981), Urbano Alonso (1996), Antunes-Cabral (2000), Teixeira (1996), Lizzi (1982), Phillipphonnat (1986), Brasfond (2006), Fundesp (1977/87), entre outros. A partir da sondagem, esses métodos de dimensionamento auxiliam o projetista a estimar diâmetro e comprimento da estaca ideal para atender as necessidades de capacidade de carga do sistema estaca-solo.
É inegável, portanto, a importância histórica das provas de carga para o desenvolvimento de métodos de cálculo. Entretanto, ainda hoje a ferramenta é de suma importância para a engenharia uma vez que o solo é por definição heterogêneo e, ainda hoje, não existe um método de prospecção totalmente representativo, onde todo o terreno seja totalmente testado e se saiba exatamente a composição do solo em todos os pontos de aplicação de carga de uma fundação. A única forma de se saber exatamente qual a carga suportada por uma fundação é através da prova de carga.
Dito isto, existem os comprimentos e cargas previstas em projeto denominadas teóricas e reais, justificado por Cintra (2013) devido a três motivos: imperfeições dos métodos de cálculo de capacidade de carga, que são aproximados, jamais exatos, variabilidade das características do solo e decisão do projetista na adoção do comprimento das estacas. Por isso, quando o projetista opta por estacas de comprimento homogêneo a dispersão da capacidade de carga cresce devido a heterogeneidade do solo. Por outro lado, adotando critérios de parada para estacas, como nega para estacas cravadas, ou avaliação do torque, para estacas escavadas, a oscilação do comprimento das estacas é que será maior.
Prova de carga estática realizada pelo engenheiro Hermes - Anos 80 (Gontijo Fundações)
Ciente de todas essas nuances presentes no projeto de fundações, a Norma ABNT NBR 6122/2019 – Projeto e execução de fundações, reconhece que a engenharia de fundações não é uma ciência exata e que riscos são inerentes a toda e qualquer atividade que envolva fenômenos ou materiais da natureza. Ainda segundo a NBR 6122/2019, que é considerada a “norma mãe de fundações”, no item 9.2: Desempenho dos elementos de fundação, é sugerido a realização dos ensaios de prova de carga em 1% das estacas do empreendimento. Além da recomendação de teste em 1% das estacas, a norma coloca a prova de carga como uma obrigação em obras especiais como pontes e viadutos e caso a tensão das estacas definidas pelo projetista seja superior a tensão máxima sugerida na Tabela 6 do item 9.2.
Prova de carga dinâmica - Geoteste
Paralelamente as sugestões da norma e ao contrário do que muitos pensam, as provas de carga podem inclusive representar uma economia aos empreendimentos, uma vez que podem apontar incongruências a tempo de uma correção. Em estacas cravadas, por exemplo, as provas de carga, quando feitas no início ou no decorrer das obras, podem representar tanto uma economia de material e de metros lineares através da adequação de um projeto superdimensionado quanto uma economia de tempo e energia através do aumento do comprimento em um projeto subdimensionado trazendo muito mais confiança aos empreendimentos.
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